Dr. Newton Miguel Moraes Richa é Médico do Trabalho, Professor dos cursos de Pós-Graduação em Engenharia de Segurança do Trabalho e em Engenharia de Manutenção da UFRJ, representante da UFRJ na Comissão Nacional de Segurança Química – CONASQ – vinculada ao Ministério do Meio Ambiente e Diretor Executivo da Quantum SMS Auditoria, Consultoria e Treinamento.
Hipócrates (460-377 a.C.), o pai da Medicina, em seu famoso livro “Ares, Águas e Lugares”, considera o clima, o solo, a água, o modo de vida e a alimentação os fatores responsáveis pelas doenças. Essa constatação teve aplicação prática e orientou as atitudes e a organização das comunidades gregas no sentido da prevenção das doenças.
A forte relação do organismo humano com o ambiente é um traço característico da compreensão hipocrática do fenômeno saúde-doença. Partindo da observação das funções do organismo e suas relações com o meio natural (periodicidade das chuvas, ventos, calor ou frio) e social (trabalho, moradia, posição social etc), Hipócrates desenvolveu uma teoria que entende a saúde como homeostase, isto é, como resultante do equilíbrio entre o homem e seu meio.
Com pouco conhecimento de Anatomia e Fisiologia, os médicos gregos tinham como características a observação atenta sem a experimentação e o registro lógico sem a metodologia científica. A base da Semiologia Médica atual já estava presente nos quatro passos fundamentais da Medicina Grega: exploração do corpo (ausculta e manipulação sensorial); conversa com o paciente (anamnese); entendimento sobre o problema (o raciocínio diagnóstico); e estabelecimento de procedimentos terapêuticos ou ações indicadas para as queixas mencionadas (prognóstico).
Os conhecimentos atuais de Anatomia e Fisiologia confirmam a integração do organismo humano no ambiente. A área alveolar de um adulto mede cerca de 140m2, expondo o sangue quase diretamente ao ar ambiente, uma vez que não existe barreira entre a zona respiratória e a membrana alveolar, que é muito delgada. Os alimentos e a água ingeridos têm um contato prolongado com 250m2 de área intestinal, separada do sangue por uma mucosa também muito delgada. A pele apresenta uma área pouco inferior a 2m2, em contato direto com o ar, mas com uma espessura significativa, constituída por várias camadas de células.
Além dos aspectos anatômicos e fisiológicos descritos acima, há influência de fatores físicos do ambiente. Algumas pessoas têm dor de cabeça causada pela exposição ao sol; outras desencadeiam uma amigdalite após a mudança de tempo de calor para frio; há registro de casos de asma agravada à meia noite, de rinite que piora em ambiente fechado; e urticária que melhora pela aplicação de calor por meio de um banho quente. Todos esses exemplos confirmam a plena integração organismo humano-ambiente, nos aspectos materiais e energéticos.
Na atualidade, as pessoas geralmente têm cinco ambientes de permanência: moradia, trabalho, estudo, lazer e transporte, assegurando a mobilidade entre os demais. Em qualquer desses ambientes pode ocorrer exposição a agentes físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e psicossociais.
Os agentes físicos consistem em vibrações, ruídos, ultrassons, temperatura, radiações ionizantes, radiações não ionizantes, pressões anormais, eletricidade e campos eletromagnéticos. Os agentes químicos orgânicos e inorgânicos podem se apresentar sob a forma de gases, vapores, líquidos, neblinas, névoas, poeiras, fumos e nanopartículas. Os agentes biológicos abrangem vírus, rickettsias, bactérias, fungos, protozoários e metazoários, incluindo animais ferozes e peçonhentos.
Os agentes ergonômicos compreendem posturas incorretas, ritmo excessivo de trabalho, monotonia, esforços repetitivos, pesos excessivos e carregamento de pesos inadequado. Os agentes psicossociais são representados por más relações no trabalho, assédio, extremos de responsabilidade, pressão social e dupla jornada.
A exposição a múltiplos agentes ambientais possibilita a ocorrência de sinergias nocivas. Assim, a exposição simultânea a ruído e a vapores de tolueno implica maior dano à audição. A solda elétrica libera materiais irritantes que, inalados, causam dano ao aparelho respiratório e tornam os soldadores mais suscetíveis que a população em geral à pneumonia pneumocócica, causada por uma bactéria.
Todos esses aspectos justificam o recente alerta da Dra. Margaret Chan, Diretora-Geral da Organização Mundial de Saúde: “Um ambiente saudável é a base de uma população saudável”.