Volkswagen assume perfil autotech
Volkswagen assume perfil autotech – O Grupo Volkswagen trouxe à luz como pretende dar as cartas no setor automotivo nos próximos anos. A pressa, misturada com o sigilo e a cautela corporativa, criam naturalmente uma nebulosidade acerca do que cada montadora vai fazer para alcançar as metas no novo contexto industrial. A companhia alemã, por outro lado, decidiu que é hora de dar mais detalhes a respeito do seu planejamento de longo-prazo.
No lugar de termos subjetivos, como busca por lucratividade e transição, o presidente do conselho de administração do grupo, Herbert Diess, em publicação em rede social, deu nomes e estabeleceu as rotinas que cada uma das unidades de negócios VW terá daqui para a frente. O discurso ousou abandonar o perfil comedido adotado por seus pares quando o assunto é futuro para, finalmente, afirmar que o ambiente competitivo mudará.
A adição de novos nomes ao jogo, que configura a chamada concorrência assimétrica, demanda uma nova configuração da empresa. Nos termos do planejamento da Volkswagen, o sucesso no futuro será viabilizado não apenas pelo desenvolvimento de novas tecnologias, mas pela capacidade de luta que cada subsidiária terá na disputa com esses novos players.
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“A empresa concluiu que passará a competir com empresas de outro setor porque o automóvel se transformará em uma plataforma conectada regida por software, algo que a organização ainda não domina e demanda muito tempo e investimento em desenvolvimento”, analisa Flavio Padovan, ex-presidente da Jaguar Land Rover, com passagens pela liderança da Ford e da Volkswagen, e atual sócio da consultoria MRD.
No caso da divisão de veículos, os desafios mostrados pela companhia apontam para uma oferta mais atrativa considerando a chegada de montadoras com propostas mais alinhadas com o futuro do setor, como é o caso da Tesla e da BYD, por exemplo. No caso da Volkswagen, essa oferta atrativa, na prática, está escorada nas outras novas unidades de negócios da companhia, na área da mecatrônica, software, baterias e soluções de mobilidade.
Rumo à plataforma única
A respeito da mecatrônica, a companhia está debruçada sobre o projeto de uma plataforma veicular chamada SSP, Plataforma de Sistemas Escaláveis em tradução livre do inglês. Este tipo de arquitetura, de acordo com a montadora, proporcionará ganhos de escala e, também, abrirá portas para que a empresa crie veículos com conteúdo tecnológico maior do que aqueles que são produzidos hoje.
Sobre a SSP poderão ser construídos todos os veículos do Grupo Volkswagen independentemente da categoria, algo que, a princípio, proporciona economia de custos e redução da complexidade de produção. Ao longo de seu ciclo de vida, estimou a montadora, poderão ser fabricados mais de 40 milhões de veículos por meio desta plataforma, cujas características também estão sendo exploradas em projetos da Stellantis e da Foxconn, fabricante de eletroeletrônicos de origem asiática.
A nova arquitetura é considerada uma evolução porque representa um tipo de hardware construído para funcionar com um software que integra todas as funções e recursos do veículo, algo que hoje ainda é incipiente no segmento. E considerando que os sistemas são a alma dos veículos do futuro, uma vez que a programação deles vai ditar sua performance e funcionalidades, a montadora também trata de focar seus esforços nessa área.
Foco em software e baterias
Quem fornecerá os sistemas veiculares à montadora será a sua subsidiária Cariad, fundada em 2020 na Alemanha e que mantém em seu quadro 4,5 mil funcionários, dentre desenvolvedores, engenheiros e designers de sistemas. A empresa já desenvolveu o VW.OS, o sistema operacional dos veículos Volkswagen, e a rede ao qual ele é conectado, a VW.AC, Volkswagen Automotive Cloud. Nesta área a Cariad é uma concorrente de empresas como Apple, Google, Mobileye e Tesla.
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Assim como os sistemas, a montadora também considera prioridade a sua atuação no campo das baterias, uma vez que a tônica nos principais mercados dos veículos VW é a descarbonização da frota no curto-prazo. Dentro do grupo existem cinco subsidiárias que fornecem soluções de carregamento, como é o caso da Elli, na Europa, e da Electrify America, nos Estados Unidos. Ambas as empresas têm a participação da VW em seus capitais. Nesse segmento concorrem CATL, BYD, Tesla e a LG, segundo a montadora.
No campo dos serviços de mobilidade, o quinto pilar do planejamento de longo-prazo da VW, a empresa atua com sua marca subsidiária Moia, criada em 2016 e que oferece serviços de mobilidade no transporte público da Alemanha por meio de veículos elétricos. No mesmo segmento concorrem Uber, Waymo e Cruise, por exemplo.
Independência regional
O foco em novas tecnologias também demandará da montadora foco nos seus principais mercados, Estados Unidos e China, especificamente, contou Herbert Diess em sua postagem nas redes sociais. Segundo o executivo, no país asiático a estratégia será a de integrar marcas e plataformas.
A China é responsável por 40% das vendas do Grupo VW e sua política de eletrificação da frota levou a fabricante alemã a concentrar os seus esforços na região, que tem, desde janeiro, a regência de um dos seus principais executivos, Ralf Brandstätter.
Nos Estados Unidos, por sua vez, a meta é a de aumentar a participação de mercado para 10%. O planejamento para a região ainda será definido uma vez que os conflitos globais aumentaram a vulnerabilidade da companhia em termos de fornecimento de componentes, e isso de certa forma é considerado um entrave importante para o abastecimento do mercado norte-americano.
A escassez de chicotes elétricos produzidos na Ucrânia atrasou o lançamento de seu crossover elétrico ID5 de abril para maio, e bloqueios na produção na China estão prejudicando o ritmo nas linhas de montagem em um momento em que a montadora está tentando aumentar as vendas de veículos elétricos no país.
Com os holofotes voltados para estes dois mercados o grupo pretende conceder mais autonomia para a marca Volkswagen em outras regiões, seguiu Diess na postagem. Isso pode indicar, por exemplo, que a operação da montadora na América do Sul vai adotar um planejamento menos global, ou seja, focado nas demandas domésticas como a ampliação do uso do etanol na frota circulante de veículos.
“Definitivamente as grandes corporações da indústria automotiva estão reconhecendo que os headquarters não devem interferir nos negócios operacionais das regiões. O papel deles esta em focar na estratégia geral e garantir sinergias dentro de cada grupo e marca. Isto porque cada região ou país tem suas peculiaridades onde a competividade faz com que marcas normalmente focadas em alto volume e market share deem prioridade ao resultado para reduzir a dependencia financeira da matriz”, explicou o consultor Osmair Garcia, que já exereceu o cargo de vice-presidente de finanças e estratégia na VW América do Sul.
“Particularmente, a marca Volkswagen ganhará mais poder e se tornará totalmente autossuficiente. Somente se tivermos marcas líderes fortes, poderemos construir grupos de marcas poderosos e alavancar economias de escala”, escreveu o executivo.