O que a indústria pensa sobre motos elétricas

216

Carros sim, mas e motos elétricas? Veja o que a indústria pensa sobre isso. Rota 2030 prevê menos carga tributária para automóveis híbridos e elétricos… mas só para carros e comerciais leves. E motocicletas?

Carros sim, mas e motos elétricas? Veja o que a indústria pensa sobre isso
Carros sim, mas e motos elétricas? Veja o que a indústria pensa sobre isso

Anunciado em junho, depois de vários meses de atraso, o Rota 2030 prevê menos carga tributária para automóveis híbridos e elétricos. O IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) desses veículos vai cair dos atuais 25% para uma faixa entre 7% e 20%, dependendo da eficiência energética do automóvel, a partir do final do ano, conforme confirmou Anfavea, a associação das montadoras.

No entanto, de acordo com o MDIC (Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços), o novo regime automotivo não contempla qualquer benefício para a comercialização de motocicletas elétricas ou híbridas.

Consultado pela reportagem, o ministério diz que “o decreto que foi publicado altera apenas as alíquotas do IPI para automóveis e comerciais leves híbridos e elétricos e, para motocicletas, até o momento, não há incentivos fiscais”.

O órgão esclarece, ainda, que as alíquotas do II (Imposto de Importação) e IPI aplicadas às motocicletas elétricas são de, respectivamente, 20% e 25%. Vale destacar que, no caso de automóveis e comerciais leves elétricos ou movidos a célula de hidrogênio, não é cobrado o imposto de importação. Para os híbridos, o percentual do II vai de 0 a 7%.

A reboque dos incentivos fiscais, grandes montadoras já confirmaram para breve a venda de automóveis 100% elétricos no Brasil — em 2019, a Nissan começa a vender o novo Leaf e, no mesmo ano, a Chevrolet lança o Bolt.

A BMW vai começar a vender novamente o i3, modelo com propulsão puramente elétrica associada a um pequeno motor a gasolina (de scooter) que opera como gerador para ampliar a autonomia. Isso sem falar nos modelos híbridos já comercializados, como Toyota Prius e Volvo XC90.

Mas essa tendência não é vista com motos

Aqui, a oferta de motos elétricas se restringe a modelos compactos como a Kasinski Prima Electra, bem como outros scooters chineses com baixo volume, sem contar opções e kits para bicicletas movidas a baterias.

No começo da década, a californiana Zero Motorcycles, que faz motos puramente elétricas, chegou a ter representação oficial no país, mas por pouco tempo — hoje, a concessionária mais próxima da fabricante do Brasil fica em Montevidéu, no Uruguai.

Procuramos a Abraciclo, associação nacional das montadoras de motos e bicicletas, e a Honda, que detém cerca de 80% das vendas locais de motocicletas, para saber as perspectivas de eletrificação de veículos de duas rodas no Brasil.

Sem planos

De ambas, a reportagem ouviu a mesma coisa: não há planos de oferta de motos elétricas e/ou híbridas dessa categoria em larga escala a curto prazo, pois aqui, nesse segmento, o foco é a tecnologia flex.

“Atualmente, os nossos associados estão concentrados na expansão da fabricação de motores flex, iniciada há cerca de dez anos. A produção em escala no Brasil é pioneira no mundo de motocicletas. Atualmente, cerca de 65% dos modelos produzidos no país são bicombustíveis”, informa a Abraciclo.

A Honda, por sua vez, destaca que “em 2009 lançou a primeira moto flex do mundo, que hoje corresponde a mais de 50% do line-up de motos produzidas localmente, proporcionando a melhora da eficiência de consumo e a redução de emissões de poluentes com a utilização do etanol”, referindo-se aos benefícios desse combustível, cujo ciclo de produção compensa as emissões de CO2 emitido na combustão, absorvido pela cana-de-açúcar.

A fabricante pondera que a oferta de motos eletrificadas é impactada justamente por conta “das particularidades energéticas de cada região”, referindo-se às vantagens do etanol feito a partir da cana no Brasil, e deixa claro que tudo depende do consumidor. “É importante considerar as expectativas e o poder aquisitivo dos consumidores, que irão ditar o ritmo de aceitação e legitimação das tecnologias elétricas”.

Em outras palavras, a empresa sinaliza que, atualmente, a maior parcela dos consumidores não está disposta a pagar mais por essa tecnologia, pois falta o famoso “custo-benefício”. Recentemente, a Honda anunciou que a partir de setembro vai iniciar no Japão as vendas do PCX Hybrid, primeiro modelo no segmento de scooters de baixa cilindrada a contar com tecnologia híbrida de produção em massa — e no momento, não há previsão de vender (ou produzir) essa versão no mercado brasileiro.

Vale dizer que mesmo lá fora motocicletas, scooters e assemelhados com propulsão eletrificada ainda estão começando a aparecer nas lojas.

Atualmente na fase 4, o Promot, programa governamental de controle de emissões e eficiência energética para motor, não prevê (ainda) a introdução de sistemas elétricos ou híbridos de propulsão para veículos de duas rodas produzidos e/ou vendidos por aqui. A única “vantagem” prevista para motocicletas elétricas seria a isenção de testes de emissões do Ibama.

A quantidade de marcas de motocicletas que investem em projetos elétricos e híbridos é bem menor que a de carros. Esta moto, por exemplo, é a Energica Ego Corsa, da "MotoGP elétrica" de 2019 (Imagem: Divulgação)
A quantidade de marcas de motocicletas que investem em projetos elétricos e híbridos é bem menor que a de carros. Esta moto, por exemplo, é a Energica Ego Corsa, da “MotoGP elétrica” de 2019 (Imagem: Divulgação)

Perspectivas

Para que motos elétricas e híbridas um dia sejam viáveis em nosso mercado, a Honda estima que “a estratégia de eletrificação de veículos requer uma infraestrutura de abastecimento capaz de atender uma frota circulante cada vez maior. Além disso, é necessário estar preparado para o aumento na demanda de consumo elétrico, considerando automóveis e motocicletas com essa especificação, priorizando, nesse cenário, o uso de fontes energéticas renováveis, que minimizam as emissões na etapa de geração de energia”.

Nenhuma palavra sobre incentivos fiscais, sinalizando que, de fato, os planos de ofertar aqui modelos eletrificados ainda estão um tanto distantes.

A Abraciclo vai na mesma linha, dizendo que a implantação de linhas de montagem de motos elétricas no país em escala comercial depende de alguns fatores: viabilidade de custo de produção, compatível com a renda dos brasileiros; autonomia de rodagem compatível com os anseios dos consumidores; definição de uma política que assegure a oferta de uma infraestrutura eficiente para o abastecimento das motocicletas; ciclo completo da energia elétrica, desde a geração até o consumo, sem aumento na poluição ambiental; e solução sustentável para o descarte das baterias e demais componentes do sistema elétrico.