Montadoras perseguem resultados de 2021
Ainda sem chips, e em meio a reestruturação do quadro de funcionários e do ritmo das linhas, as montadoras de veículos chegam na reta final do terceiro trimestre lutando para que o nível de produção do ano seja similar ao de 2021, próximo às 2,3 milhões de unidades.
Não está sendo fácil, considerando que as entregas de componentes eletrônicos ainda seguem vacilantes e o alcance da meta estipulada pelas fabricantes depende quase exclusivamente disso. Segundo dados da S&P divulgados durante o #ABX22 – Automotive Business Experience, apenas duas montadoras de veículos leves estão operando neste momento acima da metade da sua capacidade instalada.
Pelos lados das montadoras de pesados também há oscilações na entregas de chips, o que levou as empresas deste segmento a produzirem menos do que podem em termos de capacidade, como informaram à reportagem, também durante o evento, Roberto Cortes, presidente da Volkswagen Caminhões e Ônibus, e Vilmar Fistarol, presidente da CNH Industrial.
A falta de perspectiva das entregas de componentes eletrônicos das montadoras também reflete no programa de produção de seus fornecedores sistemistas, que vivem o momento crítico de mãos atadas por não poder interferir no processo de forma a mitigar a grande dor do seu cliente.
“É impressionante a quantidade de cortes de volumes que as montadoras estão promovendo na nossa programação de produção neste segundo semestre. E isso acontece praticamente da noite para o dia sem que a gente tenha tempo hábil para absorver os impactos disso”, disse, em off, executivo de uma grande sistemista europeia.
Na sexta-feira, 9, durante a divulgação do balanço do setor em agosto, o presidente da Anfavea, Marcio de Lima Leite, voltou a reforçar o quão importante para as montadoras é encerrar o ano no patamar de 2021. “Precisamos produzir mais nesses últimos meses para isso, mas dependemos muito da situação dos semicondutores”, contou o representante.
O copo cheio
Segundo Leite, contam a favor da indústria local neste momento uma eventual redução da demanda por chips na Europa, o que viabiliza, em tese, oferta maior desses componentes no mercado global. O cenário, ainda de acordo com o presidente, teria favorecido o resultado de produção das montadoras a partir de julho, quando passaram a produzir mais.
Tanto que em agosto, apontou o balanço da entidade, a produção total somou 238 mil unidades, o melhor resultado mensal do ano. Na comparação com a produção de agosto do ano passado, houve alta de 44%. No acumulado do ano, a produção já soma 1,5 milhão de unidades, alta de 4,7% na mesma base de comparação.
Outra boa notícia para o setor, mas essa mirando o longo-prazo, é um processo em curso de atração de investimentos estrangeiros que financiam a produção regional de chips. O presidente da Anfavea e membros do governo federal têm agendada uma viagem ao Japão, onde a comitiva se encontrará com fabricantes de semicondutores locais para discutir eventuais aportes aqui no Brasil.
O país, por vias políticas, quer se posicionar no mercado global como alternativa pacífica aos países que produzem chips em áreas de conflito e de intempéries naturais. O discurso, encampado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e endossado pelas lideranças da Anfavea, teria chamado as atenções também de investidores dos Estados Unidos, que adotou como política a diminuição da dependência do fornecimento asiático de componentes estratégicos.
Mas, nesse sentido, há tantas incertezas quanto às que existem no futuro da produção de veículos nacional. Se por um lado ninguém consegue precisar se a normalização das entregas dos componentes se dará em 2023 ou em 2024, por outro ninguém ainda se arrisca a dizer se no Brasil os chips serão produzidos integralmente (algo que envolve processos de alta complexidade tecnológica e altos investimentos) ou se será feito apenas o chamado encapsulamento dos processadores, atividade que demanda a importação de insumos.
Menos é mais
Paralelamente a tudo isso, se acerca ao setor automotivo nacional o esboço de um outro processo de transformação, neste caso, o do redesenho das grandes montadoras segundo as demandas atuais. Usando como exemplo o recente anúncio feito pela Mercedes-Benz de ajuste de pessoal, o presidente da Anfavea comentou que existe no país uma espécie de movimento de remodelação das fábricas.
“É o fim da verticalização. Montadoras instaladas há menos tempo no país já chegaram com um modelo de negócio baseado em mais fornecedores. Quem passou a competir com essas empresas mais novas iniciou um processo de reestruturação, assim como a Mercedes-Benz”, disse Leite, na coletiva da Anfavea.