Etanol pode perder vantagem ambiental na nova legislação de emissões

Fase L8 do Proconve que entra em vigor em 2025 prevê redução drástica de formação de ozônio causada pela queima do biocombustível

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etanol, biocombustível com baixa pegada de carbono largamente utilizado há quase quatro décadas no Brasil como símbolo maior de alternativa viável aos combustíveis fósseis, corre o risco de perder parte de sua vantagem ambiental na nova legislação brasileira, a oitava fase do Programa de Controle de Emissões Veiculares para veículos leves, o Proconve L8, que entra em vigor a partir de 2025, com metas crescentes de redução de poluentes e CO2 até 2029. Isso ocorre porque o L8 prevê corte drástico de formação de ozônio (O3) causada por gases emitidos por motores a combustão, e a queima do etanol tem potencial maior do que o da gasolina para elevar o O3 na atmosfera baixa, o que é prejudicial à saúde.

O assunto veio à tona durante reunião da Associação de Engenharia Automotiva (AEA) com a imprensa para divulgar o balanço de ações de 2019 da entidade, que entre suas atividades fornece a órgão do governo base consultiva técnica para elaboração de políticas públicas relacionadas ao setor automotivo, como é o caso do Proconve.

“Os motores a etanol terão desafio maior do que os a gasolina para cumprir alguns limites que virão com o Proconve L8”, confirma Edson Orikassa, vice-presidente da AEA e gerente de certificação de produtos da Toyota.

 

Estratégia

No momento, a estratégia para evitar essa perda de vantagem ambiental do biocombustível é o desenvolvimento de motores a etanol mais eficientes, que consomem menos e portanto emitem menos hidrocarbonetos que podem elevar a formação de ozônio na atmosfera baixa. Também entra nessa abordagem o uso de etanol com maior grau de pureza – o álcool hidratado usado no Brasil tem 7% de água em sua composição –, o que por si só já tem potencial de elevar a eficiência energética do biocombustível. No futuro, até o fim da próxima década, essa rota tecnológica poderá inviabilizar os motores flex, bicombustível etanol-gasolina, que não trabalham com máxima eficiência para poder funcionar “na média” com os dois combustíveis em qualquer proporção de mistura.

“O etanol é um patrimônio brasileiro, uma alternativa viável para redução de emissões de CO2, e os motores a combustão ainda têm muito a evoluir. Nós da engenharia temos a missão de contribuir para esse desenvolvimento”, afirma Besaliel Botelho, presidente da AEA e da Bosch América Latina.

 

Como as emissões medidas pelo L8 serão corporativas – a média formada por todos os veículos vendidos por cada fabricante –, “é provável que reduzir emissões algumas montadoras passem a vender mais carros elétricos no País, para reduzir a média da empresa com carros de zero emissão”, explica Raquel Mizoe, diretora da AEA responsável pela área de emissões e consumo, também gerente sênior de operações, estratégia de CO2 e regulações/certificações da GM América do Sul.

“O fato é que ainda estamos estudando o que fazer. O problema pode estar na forma como calculamos a formação de ozônio causada por emissões, não é uma medição direta, usamos uma fórmula que vem dos Estados Unidos. Pode ser que essa fórmula nem seja a mais adequada para usar com o etanol produzido no Brasil, que tem características diferentes. Temos uma comissão na AEA empenhada em desenvolver soluções para isso”, conta Raquel Mizoe.

Não será tarefa fácil. A nova legislação tem limites bastante apertados de emissões de hidrocarbonetos NMOG em conjunto com NOx, que podem aumentar a formação de ozônio. O Proconve L7, que entra em vigor a partir de 2022, estabelece para veículos leves de passageiros emissão máxima de 80 mg/km de NOMOG+NOx, mas quando o L8 começar a vigorar em 2025 esse limite cairá para 50 mg/km nos primeiros dois anos, depois será baixado sucessivamente para 40 mg/km e 30 mg/km de 2029 em diante.

Segundo calcula a AEA, se as mesmas tecnologias de propulsão dos veículos atuais continuarem sendo usadas sem nenhuma evolução, em 2036 o volume de ozônio na atmosfera respirável será o dobro do observado hoje. Nas camadas altas da atmosfera terrestre o gás é um filtro contra raios solares nocivos, mas quando é gerado no mesmo nível do ar respirado é um oxidante que potencializa inflamações do aparelho respiratório, provocando diversas doenças. Espera-se que a imposição de limites contenha a escalada do O3.