Indústria 4.0
Nesta etapa de desenvolvimento, a Indústria 4.0 não tem apenas o potencial de tornar a produção mais barata, sustentável e eficiente, mas também o de fornecer melhores serviços e tornar o trabalho mais humano, afirma Daniel Buhr, professor na Universidade de Tubinga, na Alemanha, e chefe do Centro de Transferência Steinbeis para a Inovação Social e Tecnológica. Em entrevista à revista Indústria Brasileira, o pesquisador na área de inovação diz que muitas oportunidades surgem com essa nova revolução industrial, mas há alguns desafios, como a definição do conceito de trabalho e as questões ligadas à privacidade, proteção e segurança de dados. Confira:
Revista Indústria Brasileira – O que devemos esperar da Indústria 4.0?
DANIEL BUHR – Podemos esperar muito, especialmente quando entendemos que a Indústria 4.0 não segue um caminho específico e voltado para a tecnologia. É, antes, um desenvolvimento que tem que ser moldado por vários atores econômicos, sociais, acadêmicos e políticos. Então, a Indústria 4.0 não tem apenas o potencial de tornar a produção mais barata, sustentável e eficiente, mas também o de fornecer melhores serviços e fazer com que o trabalho seja mais humano.
Revista Indústria Brasileira – Como a revolução digital pode impactar a indústria global nos próximos dez anos?
DANIEL BUHR – No futuro, as pessoas, as coisas, os processos, os serviços e os dados estarão interligados em rede. Estarão no centro desse processo objetos inteligentes equipados com sensores, com código QR e chips RFID (sigla em inglês para Identificação por Rádio Frequência) que se movimentam por meio da fábrica inteligente e depois para o mundo – ao longo de toda a cadeia de valor, desde o desenvolvimento do produto até o atendimento ao cliente. É assim que, no futuro, todas as informações relevantes estarão disponíveis tanto para seres humanos e máquinas como para clientes e parceiros de negócios. Então, os recursos serão usados com mais eficiência e as empresas produzirão melhor.
A Indústria 4.0 tem um enorme potencial para desenvolver novos produtos, serviços e soluções que vão melhorar a vida cotidiana das pessoas. Além disso, a rede digital permite o envolvimento direto das demandas dos clientes e a personalização econômica de produtos e serviços. Isso acelerará enormemente os processos de inovação e também poderá economizar muitos recursos. No começo, no entanto, isso significa, antes de tudo, enormes investimentos em infraestrutura e qualificação para trabalhar num mundo digital.
Revista Indústria Brasileira – Esse impacto será o mesmo nos países da América Latina, especialmente no Brasil?
DANIEL BUHR – Não automaticamente. Depende muito do sistema econômico e do regime específico de produção. Quais são os produtos e serviços típicos e como esses bens e serviços são produzidos? Grande parte da indústria alemã, por exemplo, é altamente automatizada desde o início da década de 80 (Indústria 3.0), assim como acontece em parte da indústria brasileira. Outros, no entanto, ainda são muito trabalhosos. Aqui, as tarefas dos trabalhadores tradicionais da linha de produção e dos trabalhadores do conhecimento irão se fundir em um grau cada vez maior. Como resultado, muitos processos de trabalho serão realizados de forma mais eficiente e eficaz no futuro.
No Brasil, acredito que certos trabalhos com requisitos de qualificação de nível médio e remuneração serão os primeiros a serem redundantes por meio da automação anunciada pela Indústria 4.0. O outro lado é que vocações nas extremidades inferior e superior do espectro de qualificação que são menos automatizáveis e profissões baseadas em experiência e interação ganhariam relevância. É aqui que podemos esperar que surjam campos de trabalho completamente novos, como cientistas de dados, arquitetos de nuvem e analistas de segurança.
Revista Indústria Brasileira – Um segmento onde a automação está bastante avançada é a indústria automotiva. O que podemos esperar para o futuro desse segmento industrial?
DANIEL BUHR – Oportunidades para alguns são riscos para os outros. Os líderes industriais tradicionais poderiam rapidamente se encontrar no papel de meros fornecedores, que são completamente intercambiáveis, se não puderem fornecer aos consumidores “serviços inteligentes” personalizados. Processos abertos de inovação, integração de clientes ao processo de projeto e produção, juntamente com análises de big data direcionadas, possibilitam uma variedade de novos modelos de negócios. Uma grande proporção disso é obtida por meio da venda de peças sobressalentes, atualizações e serviços.
Ao longo dos anos, os provedores criaram uma densa rede de vendas, serviços e parceiros de atendimento, a fim de ter acesso direto aos seus clientes, tanto quanto possível. A Indústria 4.0, no entanto, utiliza softwares inteligentes com análise de dados apropriada na interface existente entre fabricante e cliente, permitindo novos entrantes no mercado que poderão oferecer serviços hoje nas mãos dos fabricantes, como manutenção preventiva e fornecimento rápido de peças.
Revista Indústria Brasileira – Que papel as pessoas desempenham nesse novo ambiente industrial?
DANIEL BUHR – As soluções procuradas até agora estão principalmente no domínio tecnológico. Os seres humanos, no entanto, desempenham o papel principal quando se trata do processo de inovação: como co-criadores e produtores, como usuários e inovadores. A chave é entender a Indústria 4.0 como a interação entre inovações técnicas e sociais. Tudo leva a uma questão muito filosófica: o que precisa ser feito para garantir que a inovação técnica também possa levar ao progresso social?