Revista Lubes em Foco edição 93
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Tecnologias e desafios para o mercado de graxas no Brasil
Se engana quem pensa que os desafios do mercado de graxas estão apenas no desenvolvimento de novas formulações ou em atender demandas de sustentabilidade. Ficou claro durante o segundo dia do 4º Encontro Internacional com o Mercado de Lubrificantes, que é preciso também estar atento ao crescimento de outros mercados, que podem surgir como concorrentes na utilização de algumas matérias-primas.

O painel inicial do evento trouxe muitos temas importantes para o segmento, dentre eles a questão das matérias-primas, como o ácido graxo de palma. Com 90% da produção mundial concentradas na Indonésia e Malásia, o acesso ao produto tem sido bastante complexo, explica Felipe Camargo, gerente Comercial da ABIOSSA.
Para piorar o cenário, a produção nacional, que já é baixa, deve sofrer forte impacto da seca no Pará. Com oferta reduzida e importante participação no mercado de ração animal, o ácido graxo começa a se tornar matéria-prima para os biocombustíveis avançados, de segunda geração.
“Como o volume de ácido graxo é limitado no Brasil, um concorrente a mais tem um peso muito grande. Por conta da estiagem no Pará, temos pouco óleo para refinar, muito óleo de palma entrando no Brasil, já refinado, isso é complicado para quem trabalha com os derivados. Sempre foi difícil, mas esse ano está pior”, afirma.
Logo, Camargo aponta a estocagem como solução. “Quem tem capacidade de armazenar vai conseguir fazer compras estratégicas.” Ele também sugere as importações do Peru, Colômbia e Equador, três importantes produtores na América Latina e a Argentina. “Ao contrário do Brasil, os argentinos utilizam a gordura animal como alimento o que gera muito ácido-graxo de sebo.”
Outra matéria-prima importante é o 12HSA, derivado da mamona e cujo maior produtor é a Índia. No Brasil a cultura perdeu espaço principalmente para o milho, que vem sendo utilizado na produção de etanol.
Existem movimentos de multinacionais trazendo uma semente híbrida, que permitiria a colheita mecanizada em substituição à manual. No entanto, explica Camargo, a concorrência é muito difícil.
Mais uma vez a importação surge como alternativa, principalmente em função de uma NCM (Nomenclatura Comum do Mercosul) que possibilita alíquota zero. Em função dos baixos custos de mão-de-obra na Índia, o produto pode chega ao Brasil com preço de óleo tipo I, ressalta.Preço também foi um dos pontos abordados no Painel. Depois da disparada de preços do lítio, em função das baterias dos carros elétricos, hoje a situação é de estabilidade. O consultor Manoel Honorato, da Honorato Assessoria, acredita que ainda é vantagem importar pois o preço não tende a disparar. “A previsão é de mais uma baixa na virada do ano, em torno de 3%. Mesmo que o momento não seja o melhor, não existe mais a restrição de importação e com certeza o preço está oscilando lá fora e aqui dentro, mas para baixo.”
A questão da restrição de importação do lítio, bem como quais as NCMs corretas para definição do imposto a ser pago foram abordadas pelo gerente de Lubrificantes da Diretoria Executiva de Downstream do Instituto Brasileiro do Petróleo e Gás (IBP), Giancarlo Passalacqua.
Ele traçou uma linha do tempo sobre toda a questão da tabela TIPI e apresentou as propostas que foram feitas pelo IBP ao governo, ressaltando que se trata de uma alteração que deve ser feita pelo Executivo, por ser um Decreto.

O gerente do IBP lembrou que essa confusão vem causando uma insegurança jurídica por parte dos importadores. Vale ressaltar que a liberação da importação de graxas de lítio, surgiu após um forte trabalho do IBP. Como o país só possuía um fornecedor local, os preços eram muito altos e tiravam a competitividade das graxas brasileira para importação para a América do Sul.
Para o mediador do Painel, Pedro Nelson Belmiro, da Revista Lubes em Foco, é fundamental resolver a questão da tabela TIPI, para que todos os importadores possam trazer os produtos dentro do mesmo código, pagando os mesmos impostos. “Essa proposta, no entanto, não tem prazo, enquanto isso, as importações ficam dependendo desse Decreto para sua equalização.”
O Painel terminou com uma abordagem sobre as Normas Técnicas. O especialista Maurício Prado Alves, falou sobre a Norma ABNT 17505, destacando o que afeta principalmente as instalações antigas e que está sendo discutido na ANP. Instalações com capacidade de armazenamento superior a 60 mil litros, estão avaliando não o volume do tanque, mas da instalação.
Ou seja, a soma de todos os tanques da instalação. Logo, se a instalação tem volume superior a 60 mil litros, a distância da parede externa do dique ao nível do solo não pode ser inferior a três metros de qualquer limite da propriedade.
Para instalações com capacidade até 60 mil litros, a distância pode ser reduzida para 1,5 metros. “Isso foi objeto de discussão para atender a demanda do mercado, da legislação e dos bombeiros. O tema foi debatido nos grupos de trabalho e hoje está em consulta pública.”
A discussão é uma proposta de alteração atendendo especificamente classe 3, para instalações com capacidade de armazenamento de até 120 mil litros. “Na prática, se você tem uma instalação encostada no vizinho e é uma instalação de até 120 mil litros, ela pode ser mantida, desde que pelo menos dois lados estejam com 1,5 m, mesmo que seja dentro, não tem problema.”
A consulta pública está em andamento, as considerações devem ser avaliadas no final de novembro, acredita o especialista, e a publicação deve acontecer em 60 dias, com as devidas alterações.
O Futuro
Pensar em graxas é também avaliar o que vem pela frente. Novas tecnologias mais sustentáveis, aplicações especiais, compatibilidade de matérias-primas, dentre outras infinidades de fatores.
Essa visão de futuro passa por conhecimento. Fomentar grupos de pesquisas e fornecer arcabouço para discussões técnicas de graxas lubrificantes, faz parte da missão do National Lubricating Grease Institute (N.L.G.I.).

A gerente de P&D da ICONIC e membro do N.L.G.I., Daiane Spadari, falou sobre o trabalho do Instituto, apresentou os benefícios de ser membro e discorreu sobre as Certificações que o Instituto oferece, como a GC-LB e a HPM.
Na busca por produtos com maior valor agregado as graxas de sulfonato de cálcio estão ganhando mercado em relação às graxas de lítio. No Brasil elas ainda tem um share pequeno, mas registraram aumento significativo na quantidade de produtos que foram produzidos entre 2022 e 2023, comenta o pesquisador da ICONIC, Paulo Felipe Berto.
Os sulfonatos de cálcio são divididos em simples, usados com espessantes e os complexos, que além do espessante podem receber aditivos, o que melhora algumas propriedades. Boratos podem ser utilizados para melhorar a resistência térmica e desgaste; fosfatos são utilizados para melhorar a resistência ao desgaste e o ácido 12HSA, para melhorar a resistência à lavagem por água e exsudação, melhorar a separação de óleo.
As graxas de sulfonato de cálcio possuem alto ponto de gota, resistência à água muito melhor quando comparada à graxa de lítio, estabilidade mecânica muito boa, uma propriedade de interação intermolecular bem forte e proteção contra corrosão e baixo desgaste.
As desvantagens estão na questão da bombeabilidade, por ter uma quantidade maior de espessante, em baixas temperaturas o desempenho pode ser afetado e pode registrar alguma incompatibilidade quando substituem sistemas que utilizaram graxa de lítio por muito tempo.
Berto afirma que as graxas com sulfonato de cálcio têm uma complexidade na produção, por se tratar de um processo extremamente técnico, exigindo precisão quanto ao conhecimento de quem está fazendo.
Conhecimento também é importante quando se trata de compatibilidade. Muitas vezes as tabelas apresentam informações diferentes, de acordo com a fonte, ressalta o consultor da Zica Consultoria, Bernardo Zica Viana.
Ele lembra que toda graxa tem óleo, então é preciso considerar o tipo de óleo, assim como a compatibilidade dos aditivos que estão na graxa e os espessantes. O maior problema quando há a incompatibilidade é que a graxa amolece e escorre, o que é um problema sério. “Em casos extremos se ela vazar totalmente, você terá uma falha catastrófica.”
A complexidade da compatibilidade com os óleos aumenta quando existe o uso de graxas sintéticas ou mais nobres. Alguns ésteres causam maior inchaço da vedação do que os hidrocarbonetos, logo, deve-se ter cuidado ao usar PAOs e ésteres em aplicações em que eles podem entrar em contato com elastômeros projetados para uso com óleos minerais.
A solubilidade também é importante, pois muitas vezes quando mudamos o básico eles podem ter solubilidade diferente. “Quando a gente mistura coisas muito diferentes o aditivo dos lubrificantes que está dentro da graxa, pode dar uma característica diferente também.”
A maior referência de Norma ABNT para testes é a D6185, que fala que as graxas podem ser consideradas compatíveis se o ponto de gota das misturas é menor que a média das graxas separadas.
A estabilidade mecânica precisa estar dentro da faixa de consistência. “Se as duas graxas são de grau 2, na hora de misturar não pode virar uma graxa de grau 1. O teste de armazenamento também precisa ser levado em conta, pois as graxas tendem a se acomodar.”
O consultor orienta que o ideal é fazer o teste por partes. “Se o teste de gota já deu incompatível, nem precisa seguir com outras etapas.” Ele diz que é importante avaliar os gráficos e entender os limites aceitáveis da NLGI e de empresas como a CRC. “Graxas podem ser consideradas compatíveis em um ensaio e incompatíveis em outro. Ensaios adicionais podem e devem ser rodados, dependendo da severidade da aplicação. A recomendação é: seja conservador, a não ser que o teste seja muito bom, trabalhe como sendo incompatível, é a melhor solução.”
Quando o tema é futuro a sustentabilidade é palavra chave. Para atender esse mercado a Lubrizol desenvolveu uma tecnologia de emulsão que pode permitir o uso de um lubrificante tipo graxa ecologicamente correto, no lugar da graxa de base mineral padrão.
O processo, no entanto, não foi simples e envolveu uma série de idas e vindas no desenvolvimento do produto. O gerente Sênior de Graxas e Metalworking, Robert Dura, apresentou as várias etapas até a conquista de um resultado que atendesse aos objetivos propostos.
Segundo Dura, o conceito inicial era ajudar a reduzir o custo de produção de bens e apresentar um produto mais biologicamente correto. A tecnologia era uma emulsão contínua de óleo geralmente composta por água, óleo vegetal ou mineral e aditivos de desempenho.
O objetivo original era atingir as metas de desempenho de uma graxa para colheitadeira de algodão que atualmente utilizava uma graxa de lítio convencional NLGI 00 a 0 com aditivos.
As metas iniciais foram alcançadas, no entanto, o desempenho em campo não foi o esperado. Testes adicionais demonstraram que a estabilidade ao cisalhamento e a manutenção da emulsão intacta foram um desafio para o produto de graxa de emulsão.
A água era facilmente perdida se o armazenamento fosse superior à temperatura ambiente e o recipiente não fosse devidamente fechado. Mudanças na composição afetaram negativamente sua aparência e desempenho.
Novas abordagens foram realizadas e novo escopo definido. Originalmente direcionado a um produto gorduroso que continha alto teor de água. “No entanto, trabalhos recentes fizeram com que fossemos mais conservadores com um teor de água mais baixo.”
O produto de graxa hidratada alvo deveria ser um produto NLGI2 com a possibilidade de ser um NLGI2, 1 ou mesmo 0, dependendo da quantidade de água ou componente orgânico contido nele.
Os testes de bancada estendidos e os testes de estresse não tradicionais confirmaram que o produto é um candidato mais estável para análise do que o produto HIPE ou o produto GEN1.
“Os resultados dos testes de bancada são muito bons para um produto sem precedentes deste tipo, usando uma substância – água – que é normalmente prejudicial para a maioria das aplicações e testes de graxa lubrificante.”
Livres de MOSH e MOAH, os PAGs (Polialquilenoglicóis) têm na versatilidade estrutural e no fato de não serem perigosos, importantes diferenciais, principalmente no mercado europeu, onde o percentual de óleo mineral pode ser taxado.
PAGs são lubrificantes sintéticos do Grupo V, polímeros de óxido de etileno (EO) e ou óxido de propileno (PO). As propriedades, explica a gerente Técnica de Vendas da GEO Especialty Chemicals, Muriel Ecormier, podem ser alteradas variando o álcool inicial, o teor de EO/PO, o revestimento final e o grau de polimerização.
Os PAGs são usados em muitas aplicações industriais, incluindo graxas, gerar lubrificantes, fluidos hidráulicos, fluidos hidráulicos resistentes ao fogo (tipo HFC), lubrificantes para compressores, lubrificantes para refrigeração. As características principais são a lubricidade, estabilidade e compatibildiade.
Mais que a escolha correta da graxa lubrificante, é importante entender a condução em que o produto será utilizado. O alerta é do responsável pelo laboratório de análise de lubrificantes, Engenharia de Lubrificação e Engenharia de Confiabilidade da SKF, Emerson Pedrozo.
Apresentando um case sobre um rolamento de grande porte, ele destacou que dados da SKF demonstram que 50% das falhas em rolamentos está associada à lubrificação, sendo 36% por lubrificação inadequada e 14% por contaminação.
A contaminação líquida, inclusive, é um ponto de alerta em um rolamento, tanto no parado quanto em baixíssima rotação, pois neste caso, a característica é de rolamento parado.
Pedrozo explica que o processo de corrosão pode evoluir para uma falha severa e quanto maior a concentração de água, menor a vida útil. Logo, para fazer a seleção da graxa é preciso saber qual o rolamento/carga, rotação e temperatura. “Isso atende à grande maioria das aplicações, as comuns. Se não for comum é preciso ter mais cuidado.”
O case apresentado envolvia um rolamento 249/800 (diâmetro do furo) neste caso de 800 mm de furo; rotação 1,3mm, temperatura 55ºC, graxa utilizada lítio/cálcio com óleo base mineral, 400 cSt, lubrificação automática com 5g/dia, fator de velocidade 2418 mm/min e a contaminação alta líquida.
O especialista alerta que a graxa para esta aplicação precisa ter proteção a corrosão, excelente resistência a água, estabilidade mecânica, excelente propriedade EP, bombeabilidade, boa separação de óleo base, viscosidade limite de 460 cSt, para não ter esgotamento cinemático e isento de sólido. “Embora a literatura diga que em baixa temperatura o sólido é bem-vindo, nesse caso não. É preciso a lubrificação automatizada e o sólido, devido as pequenas folgas envolvidas no sistema, funciona como um abrasivo, que irá reduzir drasticamente a vida de todo sistema.”
A graxa proposta foi a de sulfonato de cálcio complexo em substituição à de lítio de cálcio, que garante boa estabilidade mecânica, boa proteção à corrosão. O EP superior também intrínseco ao tipo de espessante denota que haverá proteção a mais na questão de carga e o teste Emcor aponta 0/0 para todas as concentrações.
Após o primeiro ano de implantação, os rolamentos novos não apresentaram marca de corrosão, os rolamentos usados sem evolução na corrosão por umidade, melhor aderência da graxa aos rolamentos, sem necessidade de alteração da zona de carga.
A nova era da lubrificação sustentável envolve a busca por matérias-primas e processos diferenciados, bem como a parceria com os clientes. É assim que a CONDAT do Brasil vem conduzindo o desenvolvimento do sistema Lubriscore.
A unidade desenha produtos mediante as regras e necessidades de sustentabilidade do mercado. “Temos como desafio ter para cada aplicação um produto que seja ecologicamente viável. É uma questão de muito trabalho conseguir atender por termos diversas especificações de produtos.”
Guaratto explica que mesmo dentro das especificações sustentáveis é possível desenvolver produtos com eficiência, para tanto, existe uma busca de matérias-primas renováveis, com biodegradabilidade superior e que promovam emissões reduzidas de poluentes.
Estão entre essas matérias-primas, óleo vegetais como o de soja e palma, rícino e girassol. Ésteres sintéticos e/ou de alta biodegradabilidade. “Esses produtos têm uma gama muito grande de viscosidades disponíveis, solubilidade de aditivos o que traz uma facilidade na formulação e são produtos sintéticos que apresentam uma vasta gama que você pode conjugar para atender a necessidade que se procura.”