Instalações elétricas em áreas classificadas
No Brasil, a instalação elétrica em áreas classificadas em baixa tensão possui requisitos adicionais aos definidos na norma NBR 5410, de forma a não oferecer riscos de ignição em uma eventual atmosfera explosiva que surja no local. E os equipamentos elétricos e eletrônicos adequados para uso nestas regiões, além de projetados e construídos segundo as normas técnicas da série NBR IEC 60079, precisam possuir um “Certificado de Conformidade” emitido por um Organismo de Certificação de Produtos devidamente credenciado pelo INMETRO. A certificação de conformidade é um requisito legal, dado originalmente pela Portaria INMETRO 164/1991 e mantido hoje pela Portaria INMETRO 179/2010.
Porém, nas auditorias que realizamos em diversas indústrias, ainda encontramos uma grande quantidade de não conformidades nestas instalações, tanto originadas na etapa de montagem, quanto na etapa de manutenção. Como tais não-conformidades comprometem a segurança da unidade industrial, pois os equipamentos elétricos irregulares poderão atuar como fonte de ignição, causando uma explosão, vamos abordar algumas delas neste artigo.
1. Sinalização
Um fator preocupante é a ausência de sinalização adequada. “As placas de segurança devem estar claras para todos os profissionais envolvidos em serviços de áreas classificadas, além de fornecer informações sobre a classificação da zona, o grupo (para atmosfera de gás inflamável ou pós combustíveis) e a classe de temperatura dos equipamentos elétricos permitidos“.
Infelizmente, podem ser encontrados na internet modelos de placa fora dos padrões ISO, seja com profusão de textos, seja com faixas coloridas, que na verdade confundem o trabalhador. A IEC 61892-7:2014, uma norma voluntária e apenas aplicável a instalações offshore, sugeriu um modelo para a sinalização Ex, mas, tal ideia tem graves deficiências, como mostrado na Figura 1
A placa da Figura 1 é incompleta e compromete a segurança, pois:
- Redundância: o triângulo amarelo com “Ex” dentro, já significa “atmosfera explosiva”, e repetir seu significado logo abaixo, nada acrescenta;
- Informações em texto necessitam de ser redigidas em diferentes línguas para serem lidas por trabalhadores estrangeiros, situação comumente encontrada em unidades offshore;
- Nenhuma informação sobre a Zona do local;
- Nenhuma informação sobre o grupo de gás;
- Nenhuma informação sobre a classe de temperatura.
Outro exemplo de placa inadequada e que compromete a segurança em áreas classificadas está na Figura 2:
As placas de sinalização são regidas pelos princípios dados por normas internacionais ISO. Este modelo da Figura 2 demonstra porque as placas de segurança não podem ser “boladas” por leigos, com faixas coloridas, excesso de texto, além das irregularidades abaixo:
- Redundância tripla: o triângulo amarelo com “Ex” dentro, já significa “atmosfera explosiva”, o que dispensa colocar o “título” e sua definição;
- Excesso de texto: placas são para alertar, não para sanar deficiência ou ausência de treinamento;
- Nenhuma informação sobre a Zona;
- Nenhuma informação sobre o grupo de gás;
- Nenhuma informação sobre a classe de temperatura.
Ou seja, se o trabalhador apenas cuidar de “utilizar equipamentos elétricos certificados com a marcação Ex“, estará em risco se o equipamento não for adequado para aquela área!
Concluindo, para promover efetiva segurança, a placa Ex tem que ter as informações próprias da região e seguir a ISO!
A Figura 3 mostra o modelo que fornece as informações necessárias à segurança do trabalhador e da unidade industrial:
Notar que o símbolo de área classificada (triãngulo Ex) já denota a proibição de uso de fontes de ignição, requisito expresso em outros documentos normativos, por exemplo, na NR-37.
Ressalte-se que a sinalização não substitui a necessidade do treinamento, e da obrigação do empregador em informar ao trabalhador os riscos a que ele está sujeito naquele ambiente
Cabe ao empregador orientar como o trabalhador deverá proceder ao avistar cada uma das diversas placas de sinalização naquela planta industrial, conforme disposto na NR-01 . A sinalização é para alertar, por isto precisa ser eficaz!
2. Capacitação da mão-de-obra
Ainda verificamos um grande desconhecimento das empresas contratantes, que vêm aceitando “certificados de curso de 40 h da NR-10” como se fosse uma prova de capacitação em atmosferas explosivas, sob a equivocada alegação que como um dos tópicos de tal curso é “áreas classificadas”, isso seria a “capacitação”. Na verdade, este “curso de 40 h” é apenas de conscientização de riscos, e não de capacitação técnica. A NR-10 dispõe que a autorização do trabalhador somente será dada pelo curso de 40 h somados à capacitação técnica necessária para executar corretamente as atividades programadas.
E a confusão no mercado ficou maior desde que a norma NBR IEC 60079-14:2016 incluiu no Anexo “normativo” A4, que “A competência das Pessoas Responsáveis, Executantes e Projetistas deve ser verificada e atribuída, em intervalos…“, induzindo os leitores a pensarem que a certificação Ex passava a ser obrigatória, com uma massiva referência às unidades do esquema IECEx (uma organização comercial do grupo IEC dedicada à certificação de produtos, empresas e serviços, com base unicamente nas próprias normas emitidas pela IEC, e que recebe royalties de todos os certificados emitidos com a marca). Até chegamos a encontrar na internet citações equivocadas que a “ONU recomenda tal esquema“, o que induz o leitor a pensar que os diplomatas na sede da ONU em Nova York – incluindo a delegação brasileira – teriam emitido tal deliberação para todos os países.
Na verdade, o organismo que emitiu tal “recomendação” foi a UNECE – United Nations Economic Commission for Europe (uma comissão da ONU voltada unicamente para assuntos econômicos europeus, que contou com a “cooperação” da IEC e do IECEx (partes interessadas). Ressalte-se que há na ONU outras comissões semelhantes, voltadas para os interesses comerciais de outras regiões do globo, como a ECLAC – Economic Commission for Latin America and the Caribbean). A “recomendação” da UNECE, na forma de um Common Regulatory Objective (CRO), é dirigida aos países membros da União Europeia que não possuam uma regulamentação sobre equipamentos Ex, como está no documento ECE/TRADE/391 .
Na pg. 8 daquele documento, no item B.22, está que os países europeus (abrangência da UNECE), serão considerados alinhados com o CRO se adotarem um esquema de certificação Ex em sua legislação, como por exemplo, o oferecido pelo esquema IECEx, o que permitiria uma direta aceitação de produtos colocados no mercado com tais certificados. E na mesma pg. 8, nos itens B.28 e B.29, verifica-se que incluir tal proposta na legislação de cada país consolidaria o objetivo de certificar TUDO (equipamentos e empresas prestadoras de quaisquer serviços – projetos, classificação de área, seleção, instalação, inspeção, manutenção e reparos), TODOS (trabalhadores próprios e terceirizados) e SEMPRE (por meio das renovações de todos os certificados por “toda a vida das instalações“), o que garantiria uma fonte de renda vitalícia para o esquema (que também recebe das anuidades das certificadoras filiadas), pois que todos os certificados precisam ser renovados periodicamente!
No Brasil, algumas entidades passaram então a oferecer certificação pessoal Ex com unidades semelhantes às do Esquema IECEx ; porém, cabe ressaltar que para o certificado ostentar tal logotipo, a certificadora precisa estar filiada (pagar taxas e anuidades) ao esquema. De qualquer modo, apenas estão sendo oferecidas aqui (dezembro 2017) as unidades Ex 000 e Ex 001, que não se constituem suficientes para a certificação de profissionais (esta observação consta no certificado IECEx), por se limitarem à avaliação por questionário de múltipla escolha.
Segundo o Esquema IECEx, por exemplo, uma certificação de “montador Ex” precisará da aprovação dele nas unidades Ex 001, Ex 003, Ex 006 e Ex 008, o que denota um alto custo, pois cada unidade é paga individualmente.
Resumindo: o que a lei exige – NR-10 – é a capacitação técnica do trabalhador. Além da “certificação Ex” não ser obrigatória, uma “certificação” sem efetiva avaliação prática, não garante que o trabalhador executa corretamente as instalações Ex.
3. Alterações nas instalações e equipamentos Ex
As caixas à prova de explosão (Ex d) são projetadas de forma que os gases resultantes de eventual explosão interna sejam conduzidos ao exterior através de juntas projetadas adequadamente. E cabe ao usuário atentar que estas juntas fiquem a uma distância mínima de qualquer obstáculo sólido, como previsto na tabela 13 da NBR IEC 60079-14.
A não-conformidade que destacaremos aqui em caixas Ex d, é a aplicação de uma “fita engraxada” (usada para proteger tubos metálicos contra corrosão), ao redor da junta flangeada. Tal prática, apesar de citada na norma, é errada, pois além do produto não estar certificado para tal uso, o relatório CEPEL DLA 43410/2011, demonstrou haver elevação de 16% na pressão interna no ensaio de propagação, denotando um risco que não foi avaliado no certificado de conformidade, e que portanto, o invalida! Fica claro que alterações nos equipamentos e nas instalações podem comprometer a segurança das instalações e pessoas.
Conclusões
Pelo exposto, é imprescindível que as empresas que processam, manipulam, armazenam e transportam produtos inflamáveis ou combustíveis, contem com uma assessoria experiente e atualizada com os novos requisitos das normas Ex, porque os textos das normas são extensos e exigem sólidos conhecimentos técnicos para sua correta interpretação. Além disso, constata-se que muitas informações disponíveis na internet são equivocadas, e que, se não forem devidamente avaliadas, levarão a não-conformidades na instalação com potencial de causarem grandes prejuízos a trabalhadores, instalações, comunidade vizinha, e até mesmo à interrupção das atividades da empresa!
AUTOR: Estellito Rangel Jr. Consultor em sistemas industriais, instalações em áreas classificadas e segurança em eletricidade.