Rota tecnológica do etanol para o futuro da mobilidade

Tecnologias com o biocombustível podem colocar o País na vanguarda do desenvolvimento

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Rota tecnológica do etanol
A partir da esquerda: Ricardo Abreu (Mahle), Ricardo Bastos (Toyota), Eugênio Dantas (AVL), João Herrmann (VWCO), João Irineu (FCA) e Alfred Szwarc (Unica, mediador)

Rota tecnológica do etanol

Uma rota tecnológica baseada no uso do etanol é o melhor caminho que o Brasil poderia escolher em termos de futuro da mobilidade visando baixas emissões. Este foi o ponto comum defendido por alguns representantes da indústria automotiva no segundo e último dia do seminário Ethanol Summit, na terça-feira, 18, em São Paulo e promovido pela Unica, associação que reúne o setor sucroalcooleiro.

Globalmente a rota tecnológica aponta o carro elétrico como a melhor solução para o futuro da mobilidade. O modelo cujo propulsor é baseado em uma bateria e, portanto, possui zero emissão, está sendo massivamente colocado nos mercados de vanguarda, como União Europeia, Estados Unidos, Japão e agora de forma mais expressiva na China. Além disso, o conceito 100% elétrico vem direcionando as novas estratégias de negócios das montadoras e mudando seus portfólios.

“Estima-se atualmente uma introdução de 20% a 30% dos elétricos nos portfólios das fabricantes de veículos na Europa”, aponta o diretor de assuntos regulatórios da FCA, João Irineu. “Contudo, não existe uma só tecnologia ‘vencedora’ e ideal para todos. No Brasil, há uma grande oportunidade de rota tecnológica com o etanol e que só cabe a nós propor, ninguém mais no mundo vai correr atrás disso”, comentou se referindo ao uso do biocombustível em tecnologias mais eficientes de propulsão.

O executivo reforçou que as perspectivas para a ampliação do uso do etanol são promissoras, dado o esforço conjunto dos produtores do combustível e das fabricantes de veículos. Pelo lado das produtoras, há condições de produzir combustíveis de modo mais eficiente e com oferta estável e previsível. Do lado da indústria de veículos, também há um empenho para aumentar a eficiência energética da combustão do etanol a partir da melhoria dos motores a fim de atender as regulamentações das emissões, como é o caso do Rota 2030, que prevê novos níveis de CO2 para a indústria automotiva no País a partir de 2023.

No caso da FCA, já está em desenvolvimento uma versão a etanol do novo motor turbo que a montadora vai produzir em Betim (MG) para aplicação a partir de 2022.

“Estamos aprimorando calibração, partida a frio, razão ar/combustível, injeção direta, turboalimentação e melhoria termodinâmica. Com isto, o etanol será viável mesmo nos níveis rigorosos de regulamentação previstos para a próxima década. O etanol também é um combustível competitivo para veículos híbridos das categorias HEV e PHEV e pode tornar-se a base de células de combustível eficientes”, acrescentou.

O projeto de célula de combustível a etanol já existe e vem sendo uma das apostas da Nissan para eletrificar o etanol.

“É uma tecnologia disponível e adequada para o Brasil”, aponta o diretor executivo da AVL, Eugênio Dantas, que também defendeu a vanguarda brasileira no desenvolvimento e na evolução do uso do etanol rumo à eletrificação: “As engenharias brasileiras têm que se abraçar e não depender das tecnologias da China, dos Estados Unidos ou da Europa.”

A AVL é uma das empresas em conjunto com a Mahle, outras companhias do setor e universidades que participam de um consórcio para o estudo e desenvolvimento de soluções para a mobilidade no Brasil. “É um trabalho de extrema importância porque as empresas que vão fornecer para esta nova mobilidade têm que dominar esse conhecimento e criar essa cadeia”, comenta o diretor da Mahle, Ricardo Abreu.

Para Abreu, o Brasil deve criar o que ele chamou de bio-eletrificação, que é a evolução dos motores híbridos com o uso de biocombustíveis. “O etanol é o melhor aditivo para melhorar a octanagem da gasolina. Por outro lado, os híbridos no Brasil terão que ser diferentes dos híbridos feitos lá fora, tem que focar num híbrido popular, e isso não será um problema, porque o Brasil tem know how em motores pequenos 1.0”, disse e acrescentou. “O transporte público pode ser o grande vetor para a introdução dessas tecnologias.”

O etanol nos comerciais

O segmento de veículos comerciais não fica de fora do futuro do etanol na mobilidade elétrica. Para João Herrmann, da área de planejamento de produto na Volkswagen Caminhões e Ônibus, a tecnologia híbrida aliada ao etanol é a que mais faz sentido para a realidade brasileira. O executivo lembra que a empresa já possui um projeto de ônibus híbrido, o e-Flex, cujo motor a combustão é um motor leve, 1.4 turbinado flex de 150 cv de potência, fabricado pela VW São Carlos (SP) e utilizado nos modelos Golf e Audi A3 Sedan. No chassi, esse motor é utilizado como gerador de energia para a bateria e começa a funcionar sempre que a carga das baterias cai a 20% e desliga automaticamente quando atinge 80%.

Segundo Herrmann, o veículo com carroceria no padrão de 15 toneladas ainda está em fase de testes internos (em circuito fechado) feitos pela montadora, em Resende (RJ). O executivo defende que embora o custo de aquisição seja maior que um ônibus convencional a diesel, há aspectos que viabilizam a tecnologia.

“O primeiro deles é o próprio combustível: o etanol é mais barato que o diesel; diferente de um veículo 100% elétrico, ainda há necessidade de manutenção, porque há um motor a combustão aí, mas essa manutenção também será mais acessível porque o desgaste é muito menor do que um motor a diesel, estamos falando de um propulsor leve, de automóvel. No fim, o TCO [custo total da operação] se prova ser menor”, defende.

Contudo, Herrmann alerta que o setor de transporte de passageiros não vai adotar novas tecnologias sem o apoio de subsídios governamentais. “É necessário buscar o que faz mais sentido para a operação, não empurrar uma tecnologia só porque outro país vai usar. É fato que os cálculos mostraram ser essa a solução mais assertiva para o Brasil, mas a conta tem que fechar. E essa evolução não é só um papel da montadora e do sistemista: tem que envolver toda uma cadeia, o governo, e ampliar essas soluções a partir do Rota 2030 ou mesmo com o Renovabio”, disse.

Por sua vez, o diretor de relações institucionais da Toyota, Ricardo Bastos, aponta outra possibilidade para o uso do etanol quando o assunto é célula de combustível. A tecnologia atual utilizada no primeiro veículo movido a célula de hidrogênio, o Toyota Mirai, prevê a necessidade de abastecimento do veículo com hidrogênio. Atualmente, ele é apenas vendido nos Estado Unidos (Califórnia), no Japão e em alguns poucos países da Europa. O carro com célula de combustível encontra as mesmas barreiras que o 100% elétrico, relacionadas a custos e rede de recarga pouco disseminada.

Bastos aponta que há na Toyota global um projeto sendo estudado para gerar o hidrogênio a bordo a partir de biocombustível. “É um laboratório dentro do carro, por isso estamos fazendo em carros grandes, como vans. Estamos trabalhando nisso”, disse.

O executivo voltou a defender que o híbrido flex é uma das melhores tecnologias, porque possui o ciclo mais limpo, desde a geração do etanol até o baixo nível de emissões. Dados comparativos apresentados por ele apontam que no caso de um sedã médio, as emissões do híbrido são 89% menores se comparado com o mesmo modelo totalmente a combustão.

O Corolla será o primeiro híbrido flex do mundo, a ser produzido na fábrica de Indaiatuba (SP) a partir de setembro. O lançamento foi confirmado por Bastos para outubro no mercado brasileiro.