Tesla aposta na reinvenção de sua linha de montagem

335

Nas proximidades do lado norte da imensa fábrica de carros elétricos da Tesla está tomando forma uma estrutura inusitada: uma tenda de cerca de 15 metros de altura por aproximadamente 100 de comprimento.

Tesla aposta na reinvenção de sua linha de montagem
Tesla aposta na reinvenção de sua linha de montagem

A instalação abriga uma terceira linha de montagem – parte de um esforço desesperado para acelerar a produção do Modelo 3, o carro que segundo Elon Musk, o diretor-executivo da Tesla, é fundamental para a saúde financeira e o futuro imediato da companhia.

Há apenas dois anos, Musk imaginou que 2018 seria um ano decisivo. Depois de estabelecer a chancela internacional da marca com produtos de alto valor, a Tesla começaria a produzir sedãs Modelo 3 mais acessíveis. Graças a um processo acelerado de montagem baseado em alta tecnologia, as vendas da companhia teriam um crescimento cinco vezes maior, até meio milhão de veículos.

Mas não foi o que aconteceu. Musk esperava produzir 20 mil Modelos 3 por mês até dezembro, mas só pôde concluir 2.425 nos últimos três meses de 2017.

Desde então, a Tesla se preocupou em simplificar o processo de montagem, principalmente eliminando algumas máquinas robóticas complicadas que se revelaram inadequadas à realização de certas tarefas, e contratou centenas de trabalhadores para substituí-las. Se a jogada der certo, será um grande passo para as ousadas ambições da empresa: não apenas tornar-se uma fabricante de automóveis para o mercado de massa, mas também reinventar o próprio sistema de produção de automóveis.

Os primeiros indícios sugerem que os ajustes estão funcionando. No início deste mês, a companhia informou que produziu mais de 5 mil sedãs Modelos 3 em uma semana, um marco que, segundo Musk, é fundamental para a proposta da companhia de apresentar lucros nos dois últimos trimestres deste ano. Agora, ela precisa provar que é capaz de realizar várias outras coisas ao mesmo tempo.

Musk não tem um escritório na fábrica de Fremont; a Tesla diz que ele dorme lá – no chão do escritório de alguma outra pessoa, ou em um sofá – enquanto trabalha na simplificação da produção do Modelo 3. Às 3h da madrugada, numa quinta-feira, o momento de que pôde dispor na Tesla para uma entrevista por telefone, ele contou que tentava consertar um problema no setor de pintura do Modelo 3.

Indústrias automotivas tradicionais centralizam o processo de produção com os funcionários da linha de montagem, e depois transferem parte das tarefas para as máquinas. A Tesla fez o contrário. Ela projetou uma linha de produção altamente automatizada com mais de mil robôs e outras máquinas para a montagem.

Ela considera sua linha de produção um laboratório para técnicas não testadas, e a vontade de experimentar é, talvez, a maneira mais significativa da Tesla para desafiar o conhecimento convencional desta indústria. Companhias automotivas como Toyota, Honda e GM criam linhas da produção que podem fabricar carros ou caminhões à velocidade de cerca de um veículo por minuto, e essencialmente bloquear o processo de montagem. A Tesla, por sua vez, trabalha para aperfeiçoar suas linhas de produção enquanto elas estão operando.

A correria para acelerar a produção rapidamente cria tensões na companhia. Vários executivos de altos escalões, alguns da área de produção, saíram. Os operários da fábrica de 370 mil metros quadrados sentem a pressão para intensificar a produção. Em entrevistas fora da fábrica, vários deles disseram que, às vezes, trabalham de 10 a 12 horas diárias, frequentemente seis dias por semana. Eles afirmam que a rotatividade da mão de obra na linha de montagem é elevada.

Embaixo da tenda de 15 metros, a Tesla montou uma terceira linha de produção do Modelo 3, que, como as outras duas, cuida da montagem final. Acrescentar uma nova linha de montagem, ainda que temporariamente, é uma medida rara e arriscada na indústria automotiva. Uma linha criada apressadamente, em um ambiente que ainda não foi testado, pode não oferecer a qualidade que a Tesla promete.

“Ela faz tudo o que as outras linhas de montagem fazem, mas com menos mão de obra, custos trabalhistas menores e um tempo operacional muito maior”, disse Musk. “Nosso custo unitário para veículos é inferior nessa linha em comparação às outras, e notamos que a qualidade inicial é maior”.

Se isso continuar, à medida que a Tesla acelera a produção, em poucos meses ficará claro se a companhia vai apresentar um lucro.

Max Warburton, um analista da Sanford C. Bernstein, calcula que a Tesla gastou cerca de US$ 2 bilhões para criar a linha de produção do Modelo 3. “Muito acima do que qualquer outra empresa gastou para conseguir uma maior capacidade”, comentou. “A quantia de US$ 2 bilhões é um valor alucinante para investir em uma segunda linha de montagem em uma fábrica que já está produzindo”.

Tesla Model 3

Por enquanto, a Tesla gera a maior parte de sua receita com o Modelo 3 e o Modelo X, que custam a partir de US$ 70 mil. Juntas, as vendas dos dois modelos chegam a cerca de 100 mil veículos ao ano – muito pouco para compensar os bilhões que a Tesla está desembolsando para construir sua gigantesca fábrica de baterias em Nevada, desenvolver novos veículos e equipar sua fábrica de automóveis.

Isso significa que o futuro da companhia depende das linhas de montagem que a Tesla criou para produzir o Modelo 3 – e desde que a empresa possa fazê-las trabalhar. (O Estado de S. Paulo/The New York Times/Neal E. Boudette e Lauren Hepler)