A alta do dólar (18%) no primeiro semestre fez subir os custos das matérias-primas e dos investimentos, principalmente na indústria. Entre os setores mais afetados estão eletroeletrônicos, automóveis, alimentos e produtos químicos.
Como as empresas já vivem aperto financeiro, o quadro pode levar ao adiamento de investimentos e contratações. Em condições normais, as empresas reajustariam preços, mas com as famílias consumindo menos, as altas de custo no atacado não têm chegado ao varejo.
Levantamento do Bradesco mostra que as empresas já estão absorvendo essas altas desde o início do ano passado. Na conta dos economistas do banco, se o padrão histórico dos repasses fosse mantido, a inflação de manufaturados ao consumidor deveria estar em 3,5% no acumulado em 12 meses até junho, quase o dobro do efetivamente registrado (1,9%).
“As empresas da ponta da cadeia estão recebendo produtos com preços maiores e têm dificuldade de repassar ao consumidor” Leandro Negrão
A alta de 18% do dólar no primeiro semestre fez subir os custos com matéria-prima e investimentos, principalmente na indústria, num momento em que as empresas já estão com pouca gordura para queimar. Isso pode levar as companhias a adiar investimentos e contratações. Um levantamento do Bradesco indica que as altas de custo no atacado, nos últimos 18 meses, vêm sendo absorvidas antes de chegar ao varejo.
A valorização do dólar encarece a compra de insumos importados ou cotados na moeda americana. Em condições normais, as empresas reajustariam preços, mantendo seus ganhos e acelerando a inflação ao consumidor. Só que, no quadro atual, por causa da grande recessão de 2014 a 2016 e da recuperação ainda lenta da economia, as famílias estão consumindo menos.
O estudo do Bradesco sugere que as empresas já estão absorvendo altas de custos desde o início do ano passado, porque há um descompasso entre a inflação de bens industriais no atacado e os preços ao consumidor. Na conta dos economistas do banco, se o padrão histórico de repasse entre atacado e varejo fosse mantido, a inflação de manufaturados ao consumidor deveria estar em 3,5%, no acumulado em 12 meses até junho, quase duas vezes acima do efetivamente registrado (1,9%).
“As empresas da ponta da cadeia estão recebendo produtos com preços maiores e têm dificuldade de repassar ao consumidor”, diz Leandro Negrão, economista do Bradesco.
Para David Kupfer, diretor do Instituto de Economia da UFRJ, especialista em economia industrial, as indústrias estão diante de uma “escolha de Sofia”: se reajustam os preços finais podem vender menos e perder mercado, mas a opção de reduzir o lucro para absorver a alta de custos depende da situação financeira de cada empresa.
Um estudo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) mostra que as margens já estavam apertadas. Na média, a margem líquida de lucro das grandes companhias abertas ficou em 4% em 2017, um terço dos 12,9% de 2010. “A pressão de custos vem num momento de baixo crescimento, que sucede um processo de redução de margens”, diz Rafael Cagnin, economista do Iedi.
Manter uma margem de lucro mínima é importante para que as empresas tenham condições de investir e contratar. Cagnin lembra que os lucros são a principal fonte de financiamento dos investimentos nas empresas e que parte importante do maquinário é importada.
Entre os setores mais afetados com o aumento dos custos de insumos estão a indústria química, os fabricantes de produtos eletroeletrônicos, a indústria automotiva e a de alimentos. Dirigentes das entidades empresariais Abiquim (indústria química), Abinee (eletroeletrônica) e Abimapi (massas e biscoitos) disseram ao Estado que, independentemente das particularidades de cada setor, a alta e a volatilidade do dólar apontam para margens de lucro mais apertadas.
Alta do dólar x fornecedores
Na indústria automotiva, a corrida é para substituir fornecedores. A montadora Nissan antecipou para o mês passado uma reunião de rotina para avaliar a integração de fornecedores locais. Dezenas de executivos passaram um dia inteiro no encontro, na fábrica de Resende, no Sul Fluminense. Uma das alternativas é aproveitar os fornecedores nacionais da Renault – a fabricante japonesa tem uma aliança global com a montadora francesa.
“Não podemos ficar dependentes de peças importadas. Esse trabalho de nacionalização de componentes dos carros montados no Brasil é feito desde que inauguramos a fábrica em Resende (há quatro anos). Agora, é acelerar o passo”, diz Marco Silva, presidente da Nissan no País. (O Estado de S. Paulo/Vinicius Neder e Eduardo Laguna)