De acordo com agentes do setor de autopeças, a indústria automotiva só será forte no Brasil se os fornecedores tiverem competitividade. Uma das saídas seria a consolidação do mercado de componentes
Diante da perspectiva de retomada ainda lenta do mercado automotivo, agentes ligados ao setor avaliam que o setor de autopeças precisa passar por uma revolução. Uma das saídas para garantir perenidade à indústria local seria a sua consolidação.
Na avaliação do presidente da Bosch América Latina, Besaliel Botelho, com a ociosidade das montadoras em cerca de 50%, atualmente, é imperativo que as empresas da cadeia de suprimentos se tornem mais produtivas.
“Não devemos ter grandes saltos de demanda pelo menos nos próximos três anos, por isso as empresas precisam se adaptar a essa nova realidade. É preciso que haja um fortalecimento dos nossos fornecedores e uma consolidação do setor”, afirmou o executivo ao DCI.
Para ele, a questão do conteúdo local é muito mais abrangente do que apenas índices de nacionalização.
“Precisamos identificar os pontos fortes da nossa indústria e dar uma injeção de eficácia nessas empresas para que se tornem sustentáveis e consigam fornecer às montadoras e sistemistas no longo prazo. Não queremos nos tornar importadores de componentes”, observa.
Ele destaca que o setor de autopeças vem sofrendo há muitos anos. “Mas com a queda dos volumes, muitos fabricantes foram parar na UTI.”
O proprietário da metalúrgica Pro-Metal, Marcos Bozza, conta que alguns de seus concorrentes quebraram com a crise recente da indústria automotiva. “Nós conseguimos contratos de empresas que já não conseguiam atender às montadoras e sistemistas. Mas isso só foi possível porque nos preparamos ao longo dos anos, porque a queda atingiu o setor de maneira generalizada.”
A fabricante de conjuntos metálicos estampados fornece para empresas como Bosch, Honda e Volvo, mas também tem na carteira o segmento de eletrodomésticos. “Reduzir a dependência do setor automotivo foi importante”, pontua.
Com duas plantas em São Paulo, a Pro-Metal hoje opera a 70% de sua capacidade. “Investimos muito em automação e, com isso, ganhamos em produtividade”, observa Bozza, acrescentando que essa não é a realidade do setor.
No ano passado, a Pro-Metal apresentou 20% de alta do faturamento e, para este ano, a projeção de crescimento também é de 20%. “Estamos conseguindo mais contratos, porém, a rentabilidade continua fortemente pressionada”, diz.
Problema recorrente ao setor de autopeças
Para o diretor da Confederação Nacional da Indústria (CNI) em São Paulo, Carlos Alberto Pires, a cadeia de autopeças sempre teve problemas de competitividade. “A boa notícia é que existem oportunidades para trabalhar ganhos de produtividade sem grandes desembolsos do poder público.”
Ele cita como exemplo o Programa de Desenvolvimento de Fornecedores, iniciado há três anos em uma parceria entre o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC) e o Instituto Euvaldo Lodi (IEL), braço de inovação da CNI. “A cooperação de empresas âncoras, como a Bosch, e seus fornecedores-chave permite que estas empresas possam ter um desenvolvimento sustentável”, explica.
Cerca de 20 fornecedores da cadeia de autopeças foram escolhidos para receber consultoria financeira, de gestão e principalmente do conceito de lean manufacturing – ou sistema de manufatura enxuta. “Registramos aumento médio de produtividade nestas empresas de 74%, mas tivemos cases de até 130% de crescimento”, revela Botelho.
O executivo garante que a Bosch trabalha para ampliar esse programa, inclusive com outras entidades do setor. “Os ganhos que tivemos nesse período foram impressionantes. Isso mostra que é possível trabalhar com o poder público sem a contrapartida de desembolsos”, assegura.
Nesta quinta-feira (30), pouco mais de 20 fornecedores beneficiados pelo programa do MDIC participaram de uma rodada de negócios com empresas compradoras, como Hyundai Rotem e Embraer, para novas oportunidades de contratos. “Quase nenhuma iniciativa do tipo vai para frente no Brasil. Concluir esse programa já é uma vitória”, comenta o superintendente nacional do IEL, Paulo Mól.